O Papa Bento XVI iniciará mais uma visita pastoral, desta vez à Austria. Nela está agendada uma sessão de recolhimento junto ao monumento das vítimas da Shoah, na Juden Platz, em Viena, sessão de recolhimento essa que pretende homenagear as vítimas da intolerância nazi. Esse mesmo facto não constituí de resto qualquer novidade e insere-se numa política cujos contornos se começaram a desenhar no Concílio Vaticano II, mas cujo impulso decisivo se deve a João Paulo II (lembre-se a sua visita à cidade Santa e o seu recolhimento junto ao muro das lamentações em Março de 2000, por exemplo) e que o Papa Bento XVI, ainda que naturalmente assumindo uma diferença de estilo e de registo, uma vez mais afirma. Essa mesma continuidade teve já outros exemplos, como a visita histórica à Turquia e à Mesquita Azul (com a profundidade simbólica de antes ter sido sede do catolicismo ortodoxo, antes da queda de Constantinopla, hoje Istambul) ou o convite efectuado pelo mesmo Bento XVI, à controversa figura do Mufti de Alexandria.
Isto uma vez mais para concluir que, nestes conturbados tempos de atrito civilizacional, a Igreja Católica é a única que, consistentemente, aborda a problemática internacional com a consciência clara dos perigos que ela hoje levanta, praticando uma política de apaziguamento e de diálogo com as restantes religiões e civilizações, à medida que, de igual modo, faz um exame da história (e da sua própria história) procedendo à sua contrição perante factos passados, mas sem que tal signifique a cedência nos seus valores, na sua matriz e historicidade, que de resto procura reforçar. É esse difícil equilíbrio sobre o qual hoje se aventura a Igreja Católica e todo o seu peso no mundo, sendo verdadeiramente percursora no estabelecimento de uma outra modalidade de relações civilizacionais, num mundo absolutamente globalizado e refém de generalizações e etiquetagens preconceitusosas, e onde o papel da religião como patamar de proximidade, de lastro ético para o futuro, tende de igual modo, a ser desvalorizado ou mesmo ridicularizado.
É por isso que a Igreja Católica deve ser merecedora da nossa admiração, por ser a única entidade global a compreender as necessidades do nosso tempo e de empenhar todo o seu conjunto de capacidade e influência política, no estabelecimento de uma cordialidade internacional, que tem por vector de proximidade e alavanca para o diálogo, o patamar ético e moral que para todos decorre da fé em Deus. De admiração igualmente, o facto de o Papa Bento XVI nao haver cedido nas convicções que sempre procurou manifestar e que se mantenha irreversivelmente empenhado nelas, apesar de toda a incompreensão de que foi vítima, a que não será estranha uma tendência no mundo ocidental para abdicar ou mesmo renegar, todo o lastro de espiritualidade cristã sobre a qual a sua história e a sua particular visão do mundo assenta, espiritualidade não renegada pelo Papa e que serve hoje como clara afirmação contemporanieadade, antes um mundo ocidental absolutamente relativizado e falho de consistência ética e ideológica.
Num mundo radicalizado por modos díspares de vivência, por sistemas de entendimento incompatíveis, a Igreja Católica e o Papa em particular, são os primeiros a compreender a actualidade igualmente radical de Deus e de todo o seu repositório ético e histórico, como ferramenta de proximidade entre civilizações desavindas.
Bem haja Deus e o Papa. Bem hajam todos aqueles que na tolerância pelos diferentes modos de adoração, encontram nesse reduto imemorial e imanente ao Homem que é a Religião, o espaço no qual o diálogo entre irmãos possa prosseguir, quando tudo o mais haja de soçobrar....
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