sábado, 8 de abril de 2006

clube beretta 2000 - os diários

Parte I: introducing joca talhante

Passara a haver um lugar no Clube Beretta 2000 que se tornava necessário preencher, agora que o alfredo da tijuca se tinha de uma vez mandado para a Ucrânia, correndo o sério risco de lá chegando, lhe darem uma traulitada e o desmontarem como fazem aos legos (sendo mais gravoso o facto de, se o voltassem a encaixar às peças, isso já de nada lhe adiantar).
Esta ausência motivada pela concorrência directa do tráfico de órgãos internacional sobre as actividades que desenvolvíamos, foi de alguma maneira bem-vinda pelo resto de nós, pois já ninguém podia aturar o alfredo da tijuca a tirar medidas a quem passava, catalogando-as segundo morfologias físicas constantes de um quadro com que se fazia acompanhar e depois extrapolar sobre o preço a que poderia vender os rins e os pulmões no mercado. A essas sindicâncias físicas e extrapolações, imputava o alfredo da tijuca sempre a respectiva margem do lucro, que como pudemos perceber, poderia ser substancial. Assim, qualquer coisa que fosse do tijaquim das malotas (apesar de ser mais fácil surrupiar-lhe os órgãos, atento o seu estado de embriaguez permanente) isso de pouco valeria num mercado com sérias restrições ao consumo de álcool – por exemplo, as democracias nórdicas – mas já poderia valer de alguma coisa precisamente na Ucrânia ou Bielorússia , já que a cirrose aí, constituí apenas mais um modo de vida que concorre com os outros. Agora se considerássemos indivíduos como o razz ou o biela, indivíduos limpinhos, alimentados com as vitaminas e as laranjas que crescem nas árvores do quintal e a gordura do porco criado em casa, isso teria colocação em qualquer parte do mercado mundial e a bom preço, logo com uma margem significativa.
Esse convencimento no lucro fácil chegara a levar o alfredo da tijuca a propor ao razz, por uma boa maquia, a prescindir de uma vida com dois pulmões e dois rins – ficaria com um deles de cada lado, pelo menos para manter o equilíbrio. O razz, impulsivo, pregou-lhe um murro no focinho sem mais, e disse-lhe para ter cuidado na Ucrânia, não fosse um dia estar o alfredo da tijuca a prescindir de outras partes do corpo, permitindo, para sobreviver, a sua frequência a desconhecidos. Meio atordoado, o destinatário do aviso não deve ter chegado a perceber...
E assim era, atento aquele lugar para o qual se procurava um dono, que me encontrava presentemente no talho de Fornos para trocar impressões com joca talhante, uma vez por ele despachada a clientela. Por ora, ela não era muita: eu e um casal de namorados que se encostara ao balcão e que logo desancara na marmelada, enquanto o Joca talhante limpava os cinco bifes da vazia e cortava os peitos de peru que antes lhe haviam pedido, voltando eles por uma vez mais aos apalpanços e à mão no presunto, depois de acrescentarem meio quilo de costeletas de porco e entremeada ao pedido. Por fim, mais quilo de carne picada de primeira. E por incrível que tal possa parecer, havia alguma sofreguidão naquele roço inusitado e que se prolongou por todo o tempo do avio. Eu sentia-me a metade de um porco desmanchado, frio, pendurado num gancho e assistindo àquela desconformidade, sem que contudo o joca talhante mostrasse pelo episódio algum incómodo. Afinal, deveria ser clientela habitual e cuidar da carne era o seu ofício. Felizmente, carne picada, bifes da vazia, peito de peru, costeletas e entremeada era tudo aquilo que, para já, esses libidinosos do talho pretendiam. O que fariam depois com tanta carne, não é da minha conta.

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